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Vladimir Putin humilha o Ocidente

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Mario Sabino
5 minutos de leitura 22.02.2022 09:00 comentários
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Vladimir Putin humilha o Ocidente

A fala de Vladimir Putin, transmitida ontem pela televisão russa, na qual ele reconhece a “independência” das regiões ucranianas de Donetsk e Luhansk, mostrou a verdadeira face de um autocrata que, em conluio com o aparato militar que o sustenta no poder, quer reviver os tempos — faustos para poucos, infaustos para milhões — do império soviético. Vladimir Putin é um cínico cujo cinismo só pode ser exercido por causa da impotência ocidental frente à sua sanha...

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Vladimir Putin humilha o Ocidente
Reprodução/RT

A fala de Vladimir Putin, transmitida ontem pela televisão russa, na qual ele reconhece a “independência” das regiões ucranianas de Donetsk e Luhansk, para onde enviará tropas, mostrou a verdadeira face de um autocrata que, em conluio com o aparato militar que o sustenta no poder, quer reviver os tempos — faustos para poucos, infaustos para milhões — do império soviético. Vladimir Putin é um cínico cujo cinismo só pode ser exercido por causa da impotência ocidental frente à sua sanha. Essa impotência permitirá a ele anexar ambas as regiões, assim como fez com a Crimeia, em 2014. Mais: poderá levar a que tente até mesmo anexar a Ucrânia inteira. Afinal de contas, na fala de Vladimir Putin, ela foi apagada do mapa como país. Disse o autocrata russo: A Ucrânia moderna foi inteiramente criada pela Rússia — mais precisamente, pela Rússia bolchevique, comunista. Como resultado da política bolchevique, a Ucrânia soviética surgiu, e ainda hoje ela pode ser chamada de ‘Ucrânia de Vladimir Lenin’ (…) Mas agora seus descendentes demolem monumentos a Lenin na Ucrânia. É o que eles chamam de descomunização. Vocês querem descomunização? Para nós, está ótimo. Mas por que parar no meio do caminho? Estamos prontos a mostrar o que verdadeira descomunização significa para a Ucrânia. Acreditar que Vladimir Putin estava blefando ao cercar o país vizinho com 190 mil soldados e que iniciativas diplomáticas o demoveriam de uma ação hostil foi simplesmente patético. Assim como será patético crer em qualquer negociação de caráter duradouro com ele, após o fato consumado no leste ucraniano.

O autocrata russo constatou a impotência ocidental em várias ocasiões. Quando invadiu a Crimeia, na mesma Ucrânia, e os Estados Unidos e a União Europeia limitaram-se a impor sanções inócuas à Rússia. Ao intervir na Síria, para apoiar o ditador Bashar Al-Assad, e o então presidente americano Donald Trump fingiu que não viu. Na ocupação de Belarus, a pretexto de ajudar o tirano Vladimir Lukashenko contra rebeldes, e onde pretende instalar mísseis nucleares, sem reação digna desse nome da parte de quem poderia lhe fazer frente. Vladimir Putin também farejou o sangue que poderia derramar impunemente, depois que Donald Trump tentou implodir a Otan, a aliança militar ocidental, e diante da decisão de Joe Biden de retirar as tropas americanas do Afeganistão, deixando o país nas mãos do Talibã, numa fuga vergonhosa que fez a saída de Saigon, em 1975, ao fim da Guerra do Vietnã, parecer honrosa. No antigo quintal americano da América Latina, o autocrata russo armou até os dentes a ditadura venezuelana e já ameaçou instalar mísseis nucleares não apenas no país do amigo Nicolás Maduro, como em Cuba, revivendo 1962, mas sem ter um Kennedy pela frente. Não há mais respeito de Moscou por Washington.

Vladimir Putin pode contar ainda com uma Europa incapaz de se unir militarmente, governada por líderes fracos aos quais só não falta pose e dividida por interesses políticos e econômicos: o Reino Unido divorciou-se da União Europeia e ainda está às voltas com a consequência do divórcio; a França foi golpeada pelo terrorismo islâmico e se mostra incompetente até para continuar a lutar no Mali, ex-colônia fraturada pelo fundamentalismo; a Alemanha, potência com pés de barro, quer apenas continuar a fazer bons negócios com Moscou e se contentou em fornecer capacetes, mas nenhuma arma, à Ucrânia. Sim, capacetes. Por último, mas não menos importante, boa parte das nações da União Europeia depende da importação do gás natural russo para manter as suas economias em funcionamento. Ninguém pensou que se entregar à Rússia dessa forma seria um suicídio geopolítico.

Com adversários fracos como esses, que também têm de se haver com a China, em especial os Estados Unidos, Vladimir Putin avança sobre a Ucrânia, desrespeitando os tratados de Minsk, firmados em 2015. A menos que sejam mais duras do que o esperado, as novas sanções econômicas que serão impostas contra a Rússia não deverão ter maiores consequências, afora turbulências momentâneas já precificadas pelo Kremlin, visto que o país tem reservas de sobra, o equivalente a 620 bilhões de dólares, e Moscou poderá revidar no mesmo terreno, fechando a torneira do gás natural para a Europa e substituindo-a pela China como importadora, com a qual já firmou um acordo para a construção de um gasoduto. O caso contrário, se a Europa fechar a torneira, não preocupa tanto assim a Rússia. Terão de reabrir logo ou pagarão muito mais caro pelo gás importado de outro continente. Quarenta por cento do total consumido pela Europa é fornecido pelos russos.

Vladimir Putin humilha o Ocidente e o Ocidente se deixa humilhar por Vladimir Putin, porque passou a acreditar ingenuamente que não haveria mais lugar para malvadões no mundo, depois do que julgava ser o fim da história, com a queda do Muro de Berlim, em 1989. Agora sabemos qual é a versão de Moscou para “descomunização”. Vladimir Putin deveria ser um choque de realidade.

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Mario Sabino

Mario Sabino é jornalista, escritor e sócio-fundador de O Antagonista. Escreve sobre política e cultura. Foi redator-chefe da revista Veja.

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