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O império da sem-vergonhice

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Mario Sabino
4 minutos de leitura 30.03.2022 11:35 comentários
Opinião

O império da sem-vergonhice

Uma notícia muito ilustrativa passou meio despercebida ontem, salvo neste site. Como informamos, "o Departamento de Justiça dos EUA e o FBI estão oferecendo recompensa de até US$ 5 milhões (cerca de R$ 24 milhões) a quem fornecer informações que levem à identificação de destinatários de propinas da Odebrecht e da Braskem" (foto). Não é uma iniciativa excepcional, que visa apenas a essas empresas brasileiras que estavam no âmago do escândalo de corrupção na Petrobras revelado pela Lava Jato...

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Mario Sabino
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O império da sem-vergonhice
Reprodução/twitter

Uma notícia muito ilustrativa passou meio despercebida ontem, salvo neste site. Como informamos, “o Departamento de Justiça dos EUA e o FBI estão oferecendo recompensa de até US$ 5 milhões (cerca de R$ 24 milhões) a quem fornecer informações que levem à identificação de destinatários de propinas da Odebrecht e da Braskem” (foto). Não é uma iniciativa excepcional, que visa apenas a essas empresas brasileiras que estavam no âmago do escândalo de corrupção na Petrobras revelado pela Lava Jato. Ela integra o “Programa de Recompensas de Recuperação de Ativos da Cleptocracia”, aprovado pelo Congresso, no compromisso do governo americano de combater a corrupção de governos estrangeiros, como também esclarecemos. O programa está no âmbito do Gabinete de Terrorismo e Inteligência Financeira do Departamento do Tesouro e seu objetivo é “identificar e recuperar ativos roubados, confiscar os lucros da corrupção e, quando apropriado e viável, devolver esses bens roubados ou valores ao país prejudicado pelos atos de corrupção”.

Enquanto isso, no Brasil, os suspeitos de sempre em Brasília querem dar uma tremenda colher de chá a empresas que firmaram acordos de leniência com a Lava Jato, como mostra uma reportagem publicada pela Crusoé na semana passada (clique aqui para ler a íntegra aberta para não assinantes). Os acordos de leniência possibilitaram que elas escapassem de punições ou tivessem sanções menos pesadas, em troca da entrega de provas dos esquemas dos quais participaram na roubalheira perpetrada contra a Petrobras e da devolução do dinheiro surrupiado. No total, 17 empresas firmaram tais acordos, comprometendo-se a restituir 15,4 bilhões de reais aos cofres públicos. Dessa forma, ganhou-se velocidade nos processos e as empresas puderam voltar a fazer contratos com o estado. Mas, com a destruição da Lava Jato promovida por políticos e magistrados, agora querem dar um jeito para que essas empresas burlem o que foi pactuado.

Como resume a reportagem da Crusoé, alguns empresários que fecharam acordos de leniência depois de longas e intrincadas tratativas, querem rever os compromissos para obter ainda mais vantagens. Além de tentativas de repactuação de cláusulas, está em curso em Brasília uma investida para beneficiar empresas infratoras e, ao mesmo tempo, gerar dividendos políticos a integrantes do governo. Dos 15,4 bilhões de reais que a União deveria receber em decorrência dos acordos já firmado, só 6 bilhões foram efetivamente pagos até hoje. A ideia, em gestação nos bastidores, é que ao menos uma parte dos 9,4 bilhões ainda devidos pelas empreiteiras investigadas seja paga em serviços, como a construção de prédios públicos e a conclusão de obras paradas. A proposta pode parecer vantajosa. O problema, segundo especialistas e procuradores do Ministério Público Federal, é a falta de base legal para essas combinações: para viabilizar a proposta, a União teria que fazer licitações exclusivas para as empresas infratoras que fecharam acordos de leniência com o governo, o que configuraria crime de direcionamento da concorrência pública. Na prática, é algo que vai na contramão da própria ideia de licitação”.

A movimentação em Brasília, a ilha da fantasia, do desmando e da insegurança jurídica, é intensa para aprovar essa estrovenga. Ao possibilitar que empresas com passado — e passado recentíssimo — de corrupção participem de licitações que não são licitações, para abater dívidas de dinheiro roubado negociadas em acordos com a Justiça, não só contraria a lei em vigor, mas abre caminho para que, nos eventuais contratos, as beneficiadas incluam toda sorte de aditivos para aumentar o preço das obras e, assim, quitar as dívidas mais rapidamente. O desenho está nítido: vão recompensar a roubalheira com mais roubalheira, simples assim, em nome da manutenção de empregos, da retomada da economia, no contexto desse blá-blá-blá que vem sendo utilizado para acusar a Lava Jato de ter quebrado o país.

A realidade nua e sem temperos, porém, é que, nos Estados Unidos, há o império da lei, como mostra a iniciativa de recompensar as pessoas que informarem os destinatários de propinas da Odebrecht e da Braskem (e todos sabemos muito bem quem são). Aqui, o império é mesmo o da sem-vergonhice, como deixa evidente a malandragem de livrar a cara de quem pagou propina.

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Mario Sabino

Mario Sabino é jornalista, escritor e sócio-fundador de O Antagonista. Escreve sobre política e cultura. Foi redator-chefe da revista Veja.

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